segunda-feira, 12 de dezembro de 2016

#Representrans: Maria Medeiros

Descrição para cegos: Maria posa sorrindo para foto que mostra até a altura da cintura. Ela usa vestido, tem cabelos ondulados e está à frente de barracas de acampamento de uma ocupação estudantil.

Por Laianna Janu

Estudante de Letras Português que veio do interior a João Pessoa para fazer universidade, Maria é trans, militante do Levante Popular da Juventude e da setorial LGBT. Na continuidade dessa série nossa protagonista traz mais reflexões sobre a transfobia estrural.

- Nós transexuais, e especialmente as mulheres, somos atingidas nos setores primários de sobrevivência e com isso não conseguimos viver de forma plena. O Brasil é o país onde mais se mata trans do mundo, pois nem nos reconhece enquanto pessoas, nóssomos ‘coisificadas’ para nos tornarmos objetos descartáveis.
Muitas transexuais encontram nas ruas o espaço para existência, pois as escolas não estão aptas para recebê-las, o trabalho também não e a família é a primeira instituição que lhe expulsa. Não é a toa que mais de 90% das travestis e transexuais vivem da prostituição, segundo a Associação Nacional de Travestis e Transexuais, Antra. Não estamos querendo com isso dizer que seja esse um trabalho de menor valor, mas sim problematizar a razão dessa atividade ser praticamente a única alternativa para essas mulheres.
Maria até chega a comparar as travestis e transexuais com as outras pessoas da sigla LGBT, dizendo que um gay, lésbica ou bi consegue esconder mais essa realidade dos pais, do patrão ou da sociedade, mas trans são denunciados pelo próprio corpo.
Ao relatar sobre os preconceitos presentes na educação “formal”, Maria traz exemplos pessoais e de terceiras:
- No sistema educacional essa estrutura transfóbica só é reproduzida e nós temos dificuldades em utilizar o nome social e o banheiro do gênero ao qual nos identificamos. Eu participo do programa transgenalizador do estado e já ouvi inúmeros relatos de estupros coletivos de mulheres trans dentro de banheiros masculinos. Essa é uma realidade presente que faz com que essas mulheres acabem fazendo uso dos banheiros dos professores e funcionários, por exemplo.
As universidades circunvizinhas da UFPB, como a UFPE e UFSE, têm uma portaria que regulamenta o uso do nome social. Lá, desde o ato de matrícula nós podemos dar entrada ao processo para utilização do nome do nosso gênero, mas aqui nós temos que dar entrada em um processo administrativo todo semestre. Devido a essas burocracias eu nunca tive meu nome social respeitado e dependo da boa fé dos professores. Graças a Deus, a maioria dos meus vêm me chamando e tratando como Maria, mas já perdi uma disciplina no Centro da Educação porque um professor disse se negar me tratar como mulher e me chamar por Maria, pois para ele eu sou um homem e deveria cumprir esse papel na sociedade.
Eu tinha bastante interesse em criar um coletivo só de mulheres trans da UFPB, mas conheço pouquíssimas. Tenho consciência de que poucas transexuais chegam a acessar o ensino superior.
Sempre quis ser professora de literatura, nunca entrei na universidade na intenção de seguir a carreira acadêmica, mas quando cheguei aqui percebi que não havia pessoas trans produzindo e quando não há sujeitos de uma pauta fazendo e emitindo novos conteúdos, nós vemos outras narrativas hegemônicas tomarem o nosso lugar. Um exemplo disso é o fato da transexualidade ainda ser considerada um transtorno de identidade de gênero e nossa terapia hormonal ser feita por métodos ‘paliativos’. A verdade é que não há hormônios desenvolvidos para nós, o que usamos de fato são remédios para mulheres que estão na menopausa ou para homens que estão com câncer de próstata e precisam reduzir a quantidade de testosterona. Tudo isso é reflexo da falta de produção acadêmica feita por ou para nós. Por isso quero estudar e trabalhar cada vez mais para que as pessoas trans se reconheçam no futuro, para que elas se vejam no máximo de lugares possíveis e tenham uma auto-estima sempre elevada!


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