terça-feira, 4 de abril de 2017

De Paris a RuPaul: cultura drag na mídia


Descrição para cegos: fotografia de uma drag queen durante a parada do orgulho gay de Seattle, em 1995. Ela está com um dos braços levantados e faz uma careta, exibindo a língua para fora.

Por Matheus Wendell

No dia 24 de março foi ao ar nos Estados Unidos pelo canal VH1, o primeiro episódio da nova temporada do reality show RuPaul’s Drag Race. De acordo com o site Deadline, foram quase um milhão de telespectadores, o dobro da audiência em relação à estreia da temporada no ano passado.
Exibido desde 2009 e apresentado pela drag queen americana RuPaul, o programa traz em cada edição drags de vários estilos que competem em provas que testam carisma, singularidade, ousadia e talento.
Mais do que apenas um reality de entretenimento, o programa acaba sendo também um excelente instrumento de reflexão e empoderamento. Um observatório das vivências gays onde já foram discutidos temas como homofobia, transexualidade, depressão, construções de gênero, racismo, machismo e a relação entre pessoas LGBT e seus parentes.


Como afirma a própria RuPaul, o reality também une famílias. Foram inúmeras as vezes em que mães e pais de drags voltaram a estabelecer contato com seus filhos após assistirem à participação destes no programa.
Falar de RuPaul’s Drag Race também nos leva a lembrar do documentário Paris is Burning, que em 2017 completa 26 anos de lançamento. A premiada obra da diretora Jennie Livingston é um marco da cultura pop, drag e gay. Gravado em Nova York, em meados dos anos 80, o filme acompanha as vivências de gays, travestis e transexuais envolvidos com a cultura drag da época. Quem assiste, mergulha no universo das balls (bailes) - locais onde a comunidade drag se reunia para competições em várias categorias. Uma das maiores características das balls era o tom mágico e lúdico que possuíam. Um lugar onde todas e todos podiam ser o quisessem, escapando por alguns instantes das pressões e sofrimentos diários.
Recortes de raça, classe social, gênero e orientação sexual são feitos o tempo todo ao longo do documentário. Acompanhamos a trajetória de gays, travestis e transexuais de várias idades, compartilhando suas experiências, conflitos, desejos, sonhos e dificuldades enfrentadas enquanto minorias sociais. Além disso, somos apresentados às diversas referências e facetas da cultura drag, como o voguing, por exemplo, dança surgida no underground negro e gay de Nova York e que tem seus movimentos inspirados nos hieróglifos do Egito antigo, em alguns tipos de ginástica e nas poses de modelos da revista Vogue.

É possível notar em RuPaul’s Drag Race diversas referências a Paris is Burning, não só como forma de homenagem, mas também pela própria manutenção das tradições drag. Apesar das acaloradas competições existentes nesse universo, ambas as produções mostram os sentimentos de união e solidariedade que permeiam a comunidade ao longo da história. O documentário e o reality, assim como diversas outras obras já produzidas, nos fazem refletir que ser drag queen é muito mais do que performar de peruca, maquiagem e salto alto, mas é também um movimento de arte, política e resistência.


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