quarta-feira, 1 de junho de 2016

Geni, Bárbara e um Chico colorido

Descrição para cegos: Na imagem encontra-se Chico Buarque com a bandeira símbolo da diversidade sexual sobreposta à sua imagem.
Por Ewerton Correia
“Joga pedra na Geni! Joga bosta na Geni! Ela é feita pra apanhar! Ela é boa de cuspir!”. Esse é um dos pontos altos de uma das músicas de maior sucesso de Chico Buarque de Hollanda, que já nos anos 70 denunciava a hipocrisia da sociedade perante a diversidade sexual e a prostituição.
A tal Geni nasceu Genilvaldo. A obra musical criada para a peça Ópera do Malandro, de 1977, retratava uma travesti humilhada pelo povo da cidade onde o enredo é destrinchado. Ela era vista como imunda e sem dignidade até que um Zepelin ameaça explodir a cidade. Para não atacar, o comandante da nave pede uma noite de prazeres com Geni.


Neste trecho da música, Chico busca retratar a mudança imediata de comportamento dos mesmos cidadãos que atiravam pedra em Geni. “Vai com ele, vai, Geni! Vai com ele, vai, Geni! Você pode nos salvar. Você vai nos redimir. Você dá pra qualquer um. Bendita Geni!”
Chico Buarque inova com diversidade e riqueza numa métrica musical diferenciada. Por coincidência ou não, a música foi lançada nos anos 70, mesma década em que o Movimento LGBT começa a ganhar força no país ainda sem a sigla formada, uma vez que travestis só aderiram ao movimento nos anos 90. Assim, o cantor e compositor mostra-se firme ao defender o direito das minorias e ao escancarar uma realidade: o asco da sociedade com as Genis da época.
Chico não para de “colorir” suas músicas por aí. Em Bárbara, composta em parceria com Ruy Guerra para a peça Calabar, o amor entre duas mulheres é claramente notado e narrado em uma letra levada por uma melodia que envolve ricamente e que convida para a análise de mais uma letra longe de clichês.
“Bárbara, Bárbara. Nunca é tarde, nunca é demais. Onde estou, onde estás. Meu amor, vem me buscar. O meu destino é caminhar assim. Desesperada e nua. Sabendo que no fim da noite serei tua”. Neste trecho fica clara a narração feminina para outra mulher.
Um pouco depois a música fala em “ceder às tentações das bocas cruas e mergulhar no poço escuro de nós duas”, o que remete ao desejo e as demonstrações afetuosas entre mulheres sempre reprimidas, escondidas, longe do mundo ao redor.

As duas obras se mostram de maneira clara como um pedido de escancarar desejos, amores, sabores. Trazer à tona o que existe e é escondido muitas vezes pela hipocrisia. Muitos anos se passaram e as letras não perderam sentido. Muito tempo passou e Bárbaras e Genis continuam na nossa sociedade.


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